domingo, 10 de abril de 2011

Cortázar & Jung

De todos os assuntos, de todos os temas, de todas as matérias dignas de uma boa reflexão, ficou determinado em algum momento que sempre algo chamaria mais a nossa atenção mais do que outro algo qualquer.
            O que me chamou a atenção foi a quantidade de vezes em que Julio Cortázar, nas entrevistas concedidas a Ernesto González Bermejo, menciona Carl Gustav Jung.

Foram feitas investigações psicanalíticas de meus contos tanto pela linha freudiana quanto junguiana e as duas são igualmente fascinantes. Mais a linha junguiana, que acho que se adapta muito mais ao universo da criação literária.
                Esses autores de teses ou de monografias viram o que no princípio eu não via, quer dizer, a repetição, a recorrência de certos temas, a presença de certas constantes.

Sobre o tema do duplo em sua obra:

Jung poderia falar de uma espécie de arquétipo. Não se esqueça de que os duplos – não sei se explicitamente em Jung, mas, em todo caso, nas cosmogonias, nas mitologias do mundo –, o duplo, os personagens duplos, os gêmeos ilustres, como Rômulo e Remo, Castor e Pólux, os deuses duplos, são uma constante do espírito humano como projeção do inconsciente convertida em mito, em legenda.

            Sobre sua obsessão com metrôs:

O meu fascínio deve estar também no fato de o metrô ser subterrâneo, o que o conecta a arquétipos junguianos: é o inferno. O metrô é um inferno que visitamos em vida.

            Sobre a presença de animais como tema de suas histórias:

No meu território fantástico há, efetivamente, uma grande circulação de animais. Acredito que isso diz respeito também ao mundo onírico. Estão aí incluídos alguns arquétipos junguianos: o tema do touro e o tema do leão tendem a voltar nos sonhos e são sempre símbolos sexuais, ou de vontade ou de poder. Em mim, isso se dá no plano literário.

Sobre a identificação do leitor com seus contos:

Acredito que vários de meus contos atraem por serem uma espécie de eco de seu subconsciente. Se Jung tem razão e compartilhamos um inconsciente coletivo, é bastante lógico que seja assim.

            Por fim, sobre o emblemático conto “Casa Tomada”, de Bestiário:

Eu acredito que o interesse das pessoas pelo conto tem a ver não apenas com o prazer literário que possa proporcionar a elas, mas com alguma coisa que toca suas próprias experiências profundas. Aquilo que dizíamos de Jung e do inconsciente coletivo.

           

BERMEJO, Ernersto González. Conversas com Cortázar. Trad. Luís Carlos Cabral. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2002. 132 p.